Identificação biométrica pode impedir o abandono de crianças no país

Das mais de 9 mil crianças disponíveis para a adoção no Brasil, 12% tem menos de dois anos e muitas foram deixadas à própria sorte pelos pais ou tutores legais

O Cadastro Nacional de Adoção (CNA) – entidade ligada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – conta com 9,1 mil crianças disponíveis para acolhimento, de acordo com o seu banco de dados em junho de 2020. Desse total, cerca de 12%, o equivalente a quase 1,1 mil pequenos, têm menos de 2 anos de vida. Muitas dessas situações são decorrentes do abandono de crianças, em casos que exigem grande mobilização das forças policiais e costumam gerar forte apelo popular. Lançado em 2008, o CNA auxilia as Varas de Infância e da Juventude na condução dos processos de adoção.

Uma das dificuldades enfrentadas em muitas destas ocorrências é a falta de vinculação entre os pais e as crianças ou recém-nascidos. Atualmente, pela legislação brasileira, toda criança nascida viva precisa ser devidamente registrada no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), conforme mostramos neste artigo. A forma de fazer com que essa criança seja reconhecida pelo governo é a Declaração de Nascido Vivo, a DNV.

Este documento deve ser levado até um cartório. E se os responsáveis deixarem de fazer isso? E se, após o nascimento, eles resolverem cometer um ato de abandono? Haverá a necessidade de uma investigação policial, mas não se parte da relação do bebê com a mãe, o que aconteceria caso a instituição de saúde fizesse o cadastro biométrico do recém-nascido por meio da solução Natosafe.

Sem essa facilidade, casos desse tipo costumam gerar dificuldades para a polícia. Em geral, essas ocorrências acontecem em locais ermos, de difícil acesso, e que não contam com monitoramento de câmeras de segurança, sejam as do poder público ou de estabelecimentos privados, o que dificulta as investigações e a possível punição dos responsáveis pelo abandono de crianças.

Qual é o crime por abandonar crianças?

O Código Penal brasileiro é muito claro: o abandono de crianças é crime e pode ser enquadrado nos artigos 133 e 134 do Código Penal. Ressalta-se que há diferenciação entre detenção – cujo cumprimento não se inicia em regime fechado – e reclusão – dedicada a casos mais graves. Confira o que diz cada um deles e as suas penas, que podem ser aumentadas em um terço se o abandono ocorrer em local ermo e se o causador tiver relações de proximidade com a vítima.

Abandono de Incapaz – O artigo 133 considera o crime como “abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono”. A pena é de detenção de seis meses a três anos, se houver algum tipo de lesão corporal de natureza grave a reclusão pode variar de um a cinco anos e, se resultar em morte, será de quatro a 12 anos.

Exposição ou abandono de recém-nascido – A tipificação do artigo 134 considera a “exposição ou abandono de recém-nascido, para ocultar desonra própria”, com detenção de seis meses a dois anos. Se resultar lesão corporal de natureza grave, detenção de um a três anos; em caso de morte, detenção de dois a seis anos.

Cadastro Nacional de Adoção: uma solução para a entrega legal de bebês

Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que mães e pais tenham a possibilidade de abrir mão da criação de bebês, sem que cometam algum tipo de crime

É sabido que uma gravidez indesejada pode levar a uma série de atos impensados por parte dos responsáveis legais pelos bebês (tanto as mães quanto os pais): dos abortos ilegais ao abandono de crianças. Há alternativas para que sejam tomadas atitudes dentro da lei para garantir a segurança dos bebês e evitar que mães e pais cometam algum tipo de ato criminoso.

O inciso 1º do artigo 13 do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) afirma que “as gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas, sem constrangimento, à Justiça da Infância e da Juventude”. Normalmente, este serviço é oferecido pelos tribunais de justiça brasileiros, de modo a garantir tanto o acolhimento da gestante quanto evitar que o recém-nascido seja exposto a riscos.

Em geral, os programas contam com espaço para o acompanhamento de gestantes, sob a coordenação e apoio das Varas da Infância e da Juventude. A ideia é que a gestante seja preparada para este momento – e que passe por profissionais como psicólogos e assistentes sociais –, para que realmente tenha consciência do seu ato. Além disso, ao participar deste tipo de iniciativa, a gestante costuma ter o monitoramento total de sua gestação, garantindo também a saúde do recém-nascido.

Exemplos

O Programa Mãe Legal, de Pernambuco, completou 10 anos no ano passado. Nesse período, cerca de 300 mulheres ingressaram na iniciativa, de modo a evitar que as crianças sejam abandonadas ou adotadas de forma ilegal ou expostas a riscos desnecessários.

No Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por exemplo, segundo o CNJ, há espaço voltado a essas mulheres, que atendeu mais de 400 casos. Desse total, 50% delas desistiram da entrega, mas o principal objetivo é que haja preservação da saúde da mulher e do bebê. No estado de São Paulo, o Projeto de Atenção à Gestante: Entrega Voluntária ocorre em Rio Preto. A iniciativa surgiu de uma parceria entre a Vara da Infância e da Juventude, do Ministério Público e da Prefeitura Municipal.

Juiz em Rio Preto, Evandro Pelarin afirmou, na época de lançamento da iniciativa, que o programa visa evitar abortos clandestinos, tráfico de recém-nascidos, infanticídio e a entrega de bebês para pessoas da família ou conhecidos, o que não é permitido por lei.

“É uma linha tênue entre apoiar a entrega voluntária da criança e não estimular que a mãe entregue seu filho. Por isso, temos que contar com uma equipe bem preparada para lidar com cada situação”, afirmou. Há outros exemplos de iniciativas semelhantes em estados como Goiás, Espírito Santo, entre outras unidades da federação.

Dar seguranças às crianças é um ODS da ONU

Das cerca de 15 mil crianças que morriam por dia no mundo em 2016, praticamente a metade tinha menos de 28 dias de vida

Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), criados pela Organização das Nações Unidas (ONU), são uma espécie de agenda global, adotada em 2015, que prevê uma série de iniciativas sociais, ambientais, econômicas e institucionais, de modo a tornar o mundo um lugar melhor. Dividido em 17 objetivos, nosso artigo vai focar, de forma especial, no de número 3: “assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades”.

Em 2016, de acordo com a ONU, cerca de 15 mil crianças morriam por dia antes de completar o seu quinto aniversário – sendo que praticamente a metade, 7 mil, tinham algum problema antes dos primeiros 28 dias de vida. Essa é uma prova de como a vida de recém-nascidos é frágil e precisa receber a atenção necessária, desdobrando-se em cuidados para salvar vidas.

Não à toa, a Fundação Abrinq, que atua na proteção dos direitos de criança e do adolescente no Brasil, fez algumas recomendações e análises a respeito do ODS de número 3 no país. Um dos principais cuidados está relacionado à sobrevivência infantil.

“A sobrevivência infantil e na infância está associada a diversas dimensões da condição de vida das crianças, incluindo seu processo gestacional. Dessa forma, as condições de saúde das crianças e o acesso aos serviços de saúde expressam a situação de proteção e cuidados com a infância, bem como da sobrevivência infantil”, explica relatório do Observatório da Criança.

O sucesso desta estratégia depende também do que acontece logo após o nascimento do bebê. Se o acompanhamento pré-natal é bem-feito, se todos os procedimentos do parto são realizados de forma adequada, o bebê chega à vida com segurança para o mundo. A sobrevivência, agora, depende dos cuidados dos responsáveis. 

É preciso evitar o abandono de crianças. Ressalta-se que, segundo a Declaração Universal dos Direitos da Criança, uma das afirmações é de que ela “deve ser protegida contra o abandono e a exploração no trabalho”. Caso os pais não queiram assumir este papel, legalmente eles têm a opção de procurar outra alternativa. 

Além disso, o processo de cadastro e registro civil de recém-nascidos conta com falhas, que podem colocar muitos dos bebês em risco, conforme explicamos neste artigo

Quais as vulnerabilidades do processo de cadastro e identificação infantil?

Ministério Público de São Paulo já alertou que o processo de registro civil de recém-nascidos é falho e deixa os bebês expostos a riscos

Recentemente, em nosso blog, mostramos como funciona o registro de nascidos no Brasil – você pode conferir clicando aqui. De forma sucinta, todo nascido no Brasil deve ser cadastrado em um sistema específico, conhecido como Sinasc, que foi implantado em 1990. Esse cadastro é feito a partir dos dados fornecidos na Declaração de Nascido Vivo, a DNV.

Basicamente, ao ter o DNV em mãos (entregue pela maternidade, hospital ou parteira, em casos de parto domiciliar), é possível fazer o registro civil do recém-nascido. O propósito é evitar falsos registros de nascimento, assim como fazer a vinculação adequada entre os pais e mães.

No entanto, trata-se de solução pouco eficiente e passível de fraudes e outros tipos de crimes, como o tráfico de crianças, por exemplo, e não garante que bebês deixem de desaparecer de maternidades.

Atualmente, existem ferramentas desenvolvidas com o apoio da tecnologia, caso da solução Natosafe, que coleta a impressão digital do recém-nascido ainda na sala de parto, fazendo a vinculação imediata com a mãe e promovendo uma disruptura desde o nascimento, que dá mais segurança para as instituições de saúde, mães e pais, o próprio bebê e o cartório de registro civil.

Vulnerabilidades

O próprio Ministério Público de São Paulo (MP-SP), em artigo publicado no seu site, trouxe alguns dos riscos que o processo de registro civil atual oferece aos recém-nascidos. De acordo com o documento, a DNV deixa margens para as chamadas adoções à brasileira – que ocorrem fora dos mecanismos legais, além de outros problemas. 

E o motivo é simples: qualquer pessoa pode portar a DNV e o recém-nascido, fazendo o registro civil como se fosse, de fato, o seu filho. De acordo com o artigo, a evolução da tecnologia permite que se opte por caminhos digitais e mais seguros: caso da identificação biométrica (que hoje já é eficaz com as impressões de recém-nascidos) com a transferência de dados direta entre as instituições de saúde e os sistemas de registro civil. 

Há tanta falha no processo de identificação civil, que, em 2015, 2016 e 2017, o sub-registro de nascimentos no Brasil foi 4,2%, 3,2% e 2,6%, respectivamente. Estamos falando de 76 mil recém-nascidos que deixaram de ser registrados no país no período de um ano — no melhor cenário, o de 2017.

Comentários
    About Text

    Completely synergize resource taxing relationships via premier niche markets. Professionally cultivate one to one customer service.

    Últimas do Instagram
    Quick Navigation