Baby blues x depressão pós-parto: como lidar com os hormônios

Entenda a diferença entre os quadros e como uma rede de acolhimento familiar pode auxiliar a encarar as transformações trazidas pela chegada de um bebê

A gravidez é um período inesquecível, feliz e difícil para a mulher. Sim, ao mesmo tempo, é possível ter sentimentos distintos e, por vezes, conflituosos entre si. É normal e mais comum do que se imagina, embora se fale menos sobre o assunto do que se deveria.

Uma pesquisa realizada pela Fiocruz mostrou que 25% — uma a cada quatro mulheres – sofre com depressão pós-parto no Brasil. O índice do país está acima da média mundial, de 19,8%. 

A condição socioeconômica, cor parda, antecedentes de transtorno mental, hábitos não saudáveis e mulheres que não planejaram a gravidez estão mais sujeitas ao quadro. Não há estatísticas tão confiáveis quanto ao baby blues, mas há quem fale que entre 50% a 80% das mulheres vão ter esse quadro após o nascimento do filho.

Expectativa e realidade

A gestação é um momento de grande expectativa pela geração de uma vida dentro de si e, ao mesmo tempo, um período de planejamento e de se acostumar com as mudanças que estão por vir.

Basicamente, tudo aquilo que se conhece sobre a vida está para se transformar com a chegada deste novo serzinho: do relacionamento com os familiares à vida profissional, assim como as mudanças hormonais, as principais responsáveis por desencadear quadros de baby blues ou de depressão pós-parto.

Ao longo da gestação, todo um planejamento é feito para o momento do parto e os primeiros dias com o bebê, da preparação do espaço físico à montagem do enxoval, passando pelos ajustes pessoais e profissionais que se avizinham.

Tudo isso está dentro do controle da gestante e de sua família – que pode apoiá-la em muitos momentos, mas há fatores que são mais difíceis de lidar e que não temos controle, como problemas pessoais ou até mesmo financeiros.

Como falamos no artigo sobre ansiedade e medo do parto, engravidar e ter o filho é desafiador justamente por todos os aspectos que fogem do seu controle. Eles podem surgir durante a gravidez ou virem à tona após o nascimento do bebê, visto que se trata da alteração de um modo de vida propriamente dito, carregando alguns tipos de sentimentos que podem parecer descolados da nova realidade.

O que são baby blues e depressão pós-parto?

Durante os nove meses de gestação, o corpo da mulher se prepara para o momento do parto. Há inúmeras alterações que vão acontecendo: algumas delas mais evidentes (como o tamanho da barriga e a dilatação necessária para o parto) e outras nem tanto, caso das alterações hormonais. E, de repente, o bebê deixa o ambiente controlado do útero e passa a viver neste mundo.

O que seria um momento de felicidade para muitas mulheres é acompanhado de um sentimento de tristeza e desânimo. Com as alterações hormonais abruptas, algumas mães – independentemente de ser o primeiro parto ou não – têm essa sensação de infelicidade. Esse sentimento é chamado de baby blues e pode durar dos primeiros dias após o nascimento até cerca de 30 dias de vida do bebê.

Caso esse quadro persista por mais tempo, há uma tendência de que a mãe esteja com depressão pós-parto. Embora tecnicamente o baby blues não possa ser caracterizado como o princípio de uma depressão pós-parto, o quadro da enfermidade tem os sintomas bem mais agressivos e costuma estar associado a doenças psiquiátricas prévias, falta de suporte familiar e dificuldades físicas ou emocionais durante a gestação ou após o nascimento do bebê.

Intensidade e tempo diferenciam as condições

A intensidade do sintoma e o tempo do quadro são o que diferenciam o baby blues da depressão. Segundo a Sociedade Brasileira de Psiquiatria (SBP), é normal o baby blues entre as mães nos primeiros dias após o nascimento sem a necessidade de tratamento médico: “é comum que a mãe se sinta irritada, triste e com vontade de chorar, mesmo sem motivo. Mas esses sentimentos podem ser intercalados com momentos de muita alegria e satisfação. Isso se deve a mudanças hormonais que acontecem nessa fase”.

No entanto, se o quadro persistir por mais de 30 dias, é importante ter atenção, conforme a SBP: “essa é uma condição que requer tratamento médico imediato. Se não tratada, essa doença pode trazer importantes prejuízos na interação entre mãe e bebê e na formação do vínculo afetivo, além de inseguranças no cuidado com a criança, podendo afetar significativamente a saúde da criança”, ensina.

Em entrevista à Revista Pais & Filhos, o psiquiatra do Hospital Mário Covas Diego Tavares afirma que os quadros são distintos. “Na depressão, normalmente a mulher apresenta mudanças mais intensas de humor ligadas à ideia de culpa, inutilidade e até pensa em suicídio. Ela não sente mais vontade de se cuidar, não come e chega a rejeitar o filho”, diz.

Fique atento aos sintomas

Por se tratar de uma doença com fatores comportamentais, os sintomas são variados e, em caso de suspeita, a família sempre deve buscar apoio médico profissional.

Entretanto, há alguns sinais que devem ser observados de forma cautelosa, até mesmo pela mudança de rotina trazida pelo bebê em uma família:

– Falta de interesse por atividades diárias que anteriormente eram prazerosas;

– Perda ou ganho de peso rápido;

– Insônia ou excesso de sono (muitas mães sentem dificuldade em dormir após o nascimento do bebê);

– Cansaço extremo;

– Ansiedade e excesso de preocupação;

– Excesso de cobranças;

– Sentimento de culpa;

– Tristeza profunda: no caso da depressão pós-parto, é constante; para o baby blues, é intercalado com momentos de alegria;

– Dificuldade para se concentrar e tomar decisões;

– Vontade de prejudicar ou fazer mal ao bebê ou a si própria, especialmente em situações mais graves, que podem exigir afastamento da mãe do bebê.

Fatores a se observar

De forma isolada, os sintomas não são a única forma de diagnosticar a depressão pós-parto. Há alguns fatores comuns que costumam se apresentar nestas situações:

– Depressão e ansiedade já diagnosticadas – inclusive na adolescência ou em momentos pré-gestação;

– Falta de apoio da família ou do parceiro em uma situação de completa transformação da vida, como a chegada de um bebê;

– Vício em drogas ou álcool em algum momento da vida;

– Isolamento da família, de amigos ou de companheiros;

– Privação de sono.

Esses fatores costumam estar associados à depressão pós-parto, mas é importante buscar o apoio de um profissional para fechar o diagnóstico e iniciar o tratamento adequado.

Como ajudar na depressão pós-parto?

Cônjuge, familiares próximos, vizinhos e amigos têm um importante papel em uma situação que possa envolver casos de baby blues ou depressão pós-parto. Essas mulheres precisam contar com uma rede de acolhimento, capaz de compreender a sua situação e permitir que ela expresse essas sensações, sem julgamentos ou problemas.

Assim como em outras situações da maternidade, existem momentos que são cercados de romantismo e uma visão equivocada sobre o parto e a acomodação com um novo bebê em casa. Portanto, as pessoas mais próximas devem usar o seu senso de empatia para se colocar no lugar da mãe e deixar que essas sensações sejam colocadas para fora, sem comentários inoportunos.

Veja outras dicas:

Não invalide os sentimentos – Como a maternidade é rodeada de uma visão pura e perfeita, muitas pessoas julgam a mãe que conta com sentimentos como tristeza, ansiedade e preocupação. A hora não é de julgar, mas de escutar, criando uma relação de confiança.

Procure experiências semelhantes – Amigas que já viveram a experiência ou mesmo grupos de internet podem ser excelente opção para que as mães troquem informações com pessoas que já vivenciaram situações semelhantes e saibam qual é esse sentimento.

Esteja presente – Muitas mulheres apenas precisam que a sua rede de acolhimento esteja presente – isso vale para o período da gestação e no início da vida com o bebê. Respeite o espaço necessário para que a família se acomode sob uma nova perspectiva, mas se mostre presente, com mensagens ou ligações. Eventualmente, sua presença vai garantir bons – e necessários – momentos de descanso.

Informe-se – Evite dar conselhos ou informações aos quais não tenha conhecimento, como pedidos para afastar a mãe do bebê – o que só deve ser feito nas situações mais extremas. Além disso, frases como “isso é besteira” e “você deveria estar feliz” apenas tornam a situação ainda mais difícil.

Indique um profissional – É sempre um momento complicado indicar um profissional para um amigo ou parente, mas, mesmo que não o faça diretamente para a gestante/mãe, procure conversar com o cônjuge e explicar as suas suspeitas.

Aviso ao obstetra – No caso de a mulher já ter sofrido anteriormente com um quadro de depressão, vale apresentar esse histórico ao obstetra. Esses profissionais trabalham com o aconselhamento precoce, que é uma das formas de evitar que o baby blues avance para uma potencial depressão.

Como tratar baby blues e depressão pós-parto?

Enquanto a cura para o baby blues vem com o tempo – em especial, se a mãe for acolhida e conseguir compartilhar os seus sentimentos –, o mesmo não ocorre com a depressão pós-parto, que pode exigir algum tipo de intervenção com medicamentos, conforme a orientação de um profissional.

Como a mãe está em fase de amamentação, é importante que este tratamento seja totalmente monitorado pelo profissional, optando pelos medicamentos que possam gerar menos efeitos no bebê.

Em alguns casos, a recomendação pode nem sequer exigir remédios, mas sessões de terapia para auxiliar na elaboração dos sentimentos.

Baby blues e depressão pós-parto são quadros mais comuns do que se imagina em todo o mundo. Embora muitas mães carreguem sensação de culpa por nutrir sentimento de tristeza em relação à chegada do filho, trata-se de uma situação que afeta mais da metade das mães.

O primeiro passo para enfrentar é não negar a realidade e encarar de frente que um novo bebê representa uma completa mudança de vida. É natural sentir medo, ansiedade e tristeza, mesmo que o planejamento e o cuidado tenham sido os mais intensos e corretos ao longo da gestação.

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